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Conversando com uma amiga, estudante na FFLCH, lembrei-me de um episódio ocorrido na Letras da USP na década de 1970.
Certo aluno de cujo nome não me lembro, cursara a disciplina Literatura Grega I, ministrada pelo Professor José Cavalcante de Souza (UAU!!!). No curso, entre uma baforada e outra no cachimbo que teimava em apagar, o menino-aluno ficou encantando ao descobrir que “a tragédia grega, o ápice da cultura muderrna”, fora influenciada por ritos de passagem.
Em êxtase, ouvia o barbudo cearense, falar sobre Prometeu, Édipo, Antígona. O mestre girava lentamente um dos braços em círculos e, de repente, interrompia a fala para pedir a algum aluno uma caixa de fósforos, pois o cachimbo teimava em apagar. Esvaziava o fornilho nos bolsos do paletó, enchia-o novamente, ateava fogo e guardava a caixa de fósforos emprestada no outro bolso de seu puído paletó marrom. Jamais devolvia as caixas de fósforos aos alunos.
As aulas do mestre fizeram com que o jovem estudante que mal entrara nos 20 anos quisesse prosseguir os estudos clássicos e, para isso, matriculou-se em Literatura Grega II, pensando que, já ouvido o canto do bode, iria entrar em contato com a épica.
Inicia-se o semestre seguinte e, em vez do grande mestre e seu cachimbo, surge uma professora, de cujo o nome o estudante de cujo nome não lembro, não lembra, que põe na lousa o nome do curso e a bibliografia, toda ela em língua estrangeira: ICONOGRAFIA MÍTICO-RELIGIOSA NA GRÉCIA ARCAICA.
Pelas barbas do Cavalcante!
O estudante pergunta à professora:
– Aqui não é a sala de literatura grega II?
A professora, monossilábica:
-É.
Prossegue o diálogo.
– Mas nós não vamos estudar literatura grega?
– Neste semestre, estudaremos o vaso grego.
– Mas eu me matriculei em literatura grega, achando que iríamos estudar Homero.
– Não, nós vamos estudar o vaso grego e você vai ver que Homero faz referência ao vaso. Então direi a vocês o que Homero fala do vaso.
– Por que a Sra. não faz o contrário? A Sra. fala do Homero no curso e, quando chegar no ponto que Homero fala do vaso, a Sra. fala um pouquinho do vaso.
– O sr. está me desrespeitando.
Para o aluno de cujo nome não me lembro o curso acabou naquele instante, fora a primeira e única aula daquele curso. Achou que ganharia mais lendo o “Vaso Grego”, do Alberto de Oliveira: “Esta de áureos relevos, trabalhada / De dicas mãos, brilhante copa um dia, / Já de aos deuses servir como cansada, Vinda do Olimpo, a um novo deus servia.”
Chatice de poema. Feiura de amphiphoreús.
PS.: A história é verídica e juro que não me lembra o nome do aluno.