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Há paralelismo quando ocorre relação de semelhança entre duas coisas ou duas ideias. O paralelismo sintático decorre de semelhanças entre frases de mesma estrutura gramatical. Atente bem: estamos falando de paralelismo sintático, ou seja, de regras de construção de frases. Isso significa que as palavras das estruturas paralelas não precisam ser necessariamente as mesmas e, no caso de serem as mesmas, devem estar combinadas de maneiras diferentes. Se duas frases apresentam as mesmas palavras, combinadas da mesma maneira e na mesma ordem, não há paralelismo, pois se trata de uma mesma frase. Como há simetria de estrutura sintática, as frases paralelas costumam apresentar a mesma extensão.
Observe o exemplo que segue:
Duas mulheres, dois mundos. Teresa, santa, deu-se aos pobres. Diana, pecadora, entregou-se aos ricos. (Josias de Souza)
Há três frases, sendo a primeira sem verbo. As duas outras estão organizadas em torno de verbos e apresentam a mesma estrutura sintática, que é a seguinte:
núcleo nominal + adjetivo + verbo reflexivo + complemento verbal introduzido pela preposição a
Essa mesma estrutura é preenchida por palavras diferentes. Podemos então afirmar que entre a segunda e terceira frase, há paralelismo sintático. Veja mais um exemplo, que colhemos do Sermão de Quarta-feira de Cinzas, do padre Antônio Vieira (1608-1697).
Os vivos são pó levantado, os mortos são pó caído; os vivos pó que anda, os mortos pó que jaz.
Temos uma única frase (um período composto) formada por quatro orações que apresentam simetria. Há, portanto, paralelismo sintático. No entanto, há uma pequena diferença entre as orações desse período: nas duas primeiras, o verbo de ligação (são) está explícito; não duas últimas, subentendido. Nas duas primeiras, o substantivo pó é qualificado por adjetivo (levantado e caído); nas duas últimas, pó é qualificado por orações com função adjetiva (que anda e que jaz).
Como se pode notar, as quatro orações formam dois blocos de estruturas paralelas, separadas pelo ponto e vírgula. As estruturas paralelas podem assim ser representadas:
Bloco 1: sujeito + verbo de ligação + predicativo formado de substantivo + adjetivo.
Bloco 2: sujeito + verbo de ligação implícito + predicativo formado de substantivo + oração adjetiva.
O uso do paralelismo sintático confere expressividade à frase. O valor argumentativo dela decorre do uso do paralelismo sintático somado ao emprego de palavras que se opõem pelo sentido, constituindo uma figura de linguagem denominada antítese. Observe: vivos × mortos; levantado × caído; anda × jaz.
Há um tipo de paralelismo sintático em que a estrutura sintática é repetida de forma cruzada, como no célebre poema de Drummond.
No meio do caminho tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
Esse tipo de paralelismo cruzado recebe o nome de quiasmo, palavra que vem do grego, khiasmós, ação de dispor em cruz, em forma da letra grega khi (X).
Há alguns anos, uma propaganda de biscoito fez muito sucesso e muito desse sucesso se deveu ao fato de ela se valer de um quiasmo. Na peça publicitária, um narrador fazia a seguinte pergunta:
Tostines é fresquinho porque vende mais ou vende mais porque é fresquinho.
A repetição cruzada de “é fresquinho porque vende mais” / “vende mais porque é fresquinho” tem um efeito persuasivo importante, porque instaura um círculo vicioso. Não há, portanto, resposta para essa pergunta, de sorte que ambos os predicados atribuídos ao biscoito passam a ser tomados como verdadeiros.
Se o paralelismo sintático contribui para a expressividade, a quebra do paralelismo atua em sentido contrário, uma vez que, não estabelecendo um vínculo sintático onde deveria haver, interfere na coesão.
Certas construções sintáticas se caracterizam por apresentarem pares correlativos. São exemplos de pares correlativos:
não só … mas também; não somente … mas ainda, que aparecem em frases com orações aditivas;
tanto … que, tão … que, presentes em frases em que a segunda oração é consecutiva;
quanto mais … mais (ou menos), quanto menos … menos (ou mais), presentes em orações que indicam proporção;
ora … ora, quer … quer, seja… seja, que aparecem em orações alternativas.
Se, num texto, emprega-se o primeiro elemento de um par correlativo, a expectativa é que o segundo apareça. Se não aparecer, houve quebra de coesão. Num texto, se em algum momento se emprega “por um lado”, espera-se que adiante apareceça “por outro (lado)”. Se não aparecer, quebrou-se o paralelismo, redundando quebra de coesão.
Chamamos a atenção para o fato de que, quando se coordenam duas orações (ou palavras), elas devem pertencer à mesma categoria. Assim, será quebra de paralelismo sintático coordenar orações de natureza diferente. Numa frase como Funcionários cogitam uma nova greve e isolar o governador, há ausência de paralelismo sintático uma vez que se coordenam termos de classes gramaticais diferentes (greve – substantivo e isolar – verbo).
Uma construção paralela exigiria que se coordenassem termos simétricos, isto é, pertencentes a uma mesma classe de palavras; portanto, para que houvesse paralelismo, a redação deveria ser Funcionários cogitam nova greve e isolamento do governador (substantivos coordenados) ou Funcionários cogitam realizar nova greve e isolar o governador (dois verbos coordenados).
Mais um exemplo de ausência de paralelismo sintático:
Não viajei nas férias por estar doente e porque não tinha dinheiro.
Nesse exemplo, coordenam-se duas orações que exprimem causa. A primeira apresenta-se sob a forma de oração reduzida (por estar doente); a segunda, sob a forma de oração desenvolvida (porque não tinha dinheiro). Para estabelecer a simetria, bastaria redigir a frase de forma que as duas orações causais coordenadas entre si apresentassem a mesma estrutura gramatical (ambas reduzidas ou ambas desenvolvidas). Assim:
Não viajei nas férias por estar doente e por não ter dinheiro.
ou
Não viajei nas férias porque estava doente e porque não tinha dinheiro.
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