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Quem me conhece sabe da minha admiração profunda pelo escritor russo Anton Tchékhov (1860 – 1904). Já comentei aqui alguns de seus contos e já falei de suas peças. Volto a Tchékhov para falar de uma obra que não tinha lido ainda: “Os males do tabaco”. Esse texto aparece num pequeno livro publicado pela Ateliê Editorial chamado Os males do tabaco e outras peças em um ato. A seleção, organização e notas é de Homero Freitas de Andrade.
O livro traz sete peças pouco conhecidas do público brasileiro: “O canto do cisne”, “O urso”, “O pedido de casamento”, “Trágico à força”, “As bodas”, “O jubileu” e, evidentemente, “Os males do tabaco”, em duas versões. A primeira de 1887; a segunda, de 1902. Ambas com tradução de Aurora Fornoni Bernardini.
Algumas são muito engraçadas; outras apresentam situações tão absurdas, ridicularizando situações banais, lembrando o teatro do absurdo de Ionesco. Restrinjo-me a dizer algumas palavras sobre “Os males do tabaco”, uma cena-monólogo em único ato. As duas versões apresentam algumas diferenças e é difícil dizer qual é a melhor.
Um único ator em cena, Márkel Iványtch Niúkhin, um homem casado com uma dona de pensionato para moças ( na versão de 1902, ela também é dona de uma escola de música), faz uma palestra para um auditório sobre os males do tabaco.
O absurdo da situação é que Márkel fala de tudo, especialmente de sua vida privada, de seu ralacionamento com a mulher, de suas filhas, de suas superstições, das panquecas que sobraram e teve de comer… Chega até a fazer propaganda dos estabelecimentos administrados por sua esposa, mas do assunto da palestra, os males do tabaco, praticamente nada fala. Quando começa a falar, muda rapidamente de assunto e volta a falar de sua vida privada.
À medida que se vai lendo (ou assistindo ao monólogo representado), o leitor/espectador entra no clima de absurdo criado pelo texto. A expectativa em saber quais são os males do tabaco vai crescendo, mas nunca é atendida pelo palestrante que insiste em falar de tudo, exceto dos males do tabaco.
As duas versões terminam sem que Márkel diga efetivamente quais são os males do tabaco. Na primeira, termina apenas se despedindo do público; na segunda, ainda chega a dizer: “… seja como for, permito-me a esperança de que esta minha conferência sobre ‘os males do tabaco’ tenha sido de alguma utilidade”. Faz uma reverência e se retira majestosamente.