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Um dos tipos de nossa literatura que melhor satirizam o gramático prescritivista e purista é o Lobo, o consultor gramatical de ‘O Globo’, do livro ‘Recordações do escrivão Isaías Caminha’, de Lima Barreto.
No romance, o narrador, Isaías Caminha, quando se refere ao gramático (e evidentemente às posições que esse tipo de gramático defende), o faz com muito sarcasmo, ridicularizando o tipo em diversas passagens do romance.
Numa delas, perguntado por um colega se o certo é um copo d’água ou um copo com água, o caga-regras responde em tom solene:
“Conforme: se se tratar de um copo cheio, é um copo d’água; se não estiver perfeitamente cheio, um copo com água”.
Não é preciso dizer que o velho e esquálido gramático não admitia qualquer variação linguística, pois para ele, esses falares conspurcavam a língua de Vieira e Frei Luís de Sousa.
O dono do jornal, Ricardo Loberant, queria que o periódico passasse a adotar uma variedade de língua que falasse mais diretamente aos leitores. Lobo é contra e argumenta que a língua é sagrada, que é um pouco do culto à pátria e que o jornal não podia corromper a língua de Vieira. Diz o gramático ao dono do jornal:
“Isto que se fala aqui não é língua, não é nada: é um vazadouro de imundícies. Se Frei Luís de Sousa ressuscitasse, não reconheceria a sua bela língua nessa amálgama, nessa mistura diabólica de galicismos, africanismos, indianismos, anglicismos, cacofonias, cacatonias, hiatos, colisões… Um inferno! Ah! doutor! Não se esqueça disto: os romanos desapareceram, mas a sua língua ainda é estudada…”
Não preciso dizer que fim levou o Lobo.