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Uma das formas de verificar se alguém compreendeu um texto é pedir que o reproduza com suas palavras. A capacidade de resumir textos é um indicador de que o leitor / ouvinte / espectador compreendeu o que leu / ouviu / assistiu.
Quando lemos um texto narrativo como um conto ou um romance, se conseguimos atribuir sentido a ele, somos capazes de reproduzi-lo a alguém. O mesmo acontece na “leitura” de textos sincréticos, aqueles, que no plano da expressão, apresentam linguagens diferentes, de que são exemplos filmes, séries de tevê e novelas gráficas.
Em textos verbais ou sincréticos, o que de fato reproduzimos quando o contamos a alguém? Sem dúvida alguma, o que reproduzimos é a historia narrada; em outros termos, a sucessão de ações e as transformações de sujeitos por ação de outros sujeitos. Nessa reprodução, dispomos as ações numa determinada ordem, de modo que a história faça sentido para quem não a leu / ouviu / assistiu. Normalmente essa ordem implica um antes e um depois, ou seja, recuperamos a história em sua cronologia, isto é, em seu desenvolvimento na ordem do tempo.
A história narrada recebe o nome de diegese. Outros autores a chamam de fábula (não confundir com um tipo de conto em que os personagens são animais). A reprodução que alguém faz de uma história que leu / ouviu / assistiu recebe o nome de paráfrase. O tempo todo fazemos paráfrases, isto é, recontamos com nossas palavras a diegese de alguma narrativa. Parafrasear um texto é reproduzir com outras palavras aquilo que um texto diz.
Nesse ponto, chamamos a atenção para um fato de ordem prática. Muitos estudantes, quando solicitados a fazerem análise de um texto, em vez de o analisarem, acabam por fazer uma paráfrase. Analisar textos não é reproduzir a história narrada com outras palavras (paráfrase), mas explicitar os procedimentos textuais e discursivos que explicam o que o texto diz e como faz para dizer o que diz. Isso implica que se mostre como se organiza o texto narrativo e ainda os elementos que o constituem: tempo, espaço, narrador, personagens, etc.
Em seu Dicionário de semiótica, Greimas e Courtés esclarecem que a diegese é o aspecto narrativo do discurso, a história, a narrativa propriamente dita. A diegese corresponderia então ao narrado, “que se distingue assim do ‘discurso’ (entendido como a maneira de apresentar o narrado)”. Carlos Reis e Ana Cristina M. Lopes, em seu Dicionário de Narratologia conceituam diegese como “o universo do significado, o ‘mundo possível’ que enquadra, valida e confere inteligibilidade à história”.
A diegese é, enfim, o conjunto dos acontecimentos ligados entre si que nos são comunicados, ou seja, a história narrada. A pergunta que orienta a leitura, no nível da diegese, é: é depois?
A forma como os acontecimentos são narrados chamamos de enredo. Outros autores preferem o nome trama. Se a diegese diz respeito à história propriamente dita, o enredo diz respeito à forma como está estruturado o texto. Pela diegese, o leitor sabe o que ocorreu; o enredo é a maneira pela qual ele toma contato com a história narrada. O enredo, portanto, diz respeito às estratégias discursivas do narrador para apresentar o narrado (a diegese) de modo a obter determinados efeitos de sentido.
Se a diegese é, por assim dizer, o material pré-literário, o enredo é o tratamento que se dá à diegese, obtendo-se com isso efeitos de literariedade, entendendo-se por essa palavra os procedimentos discursivos que caracterizam um texto como pertencente ao domínio da literatura.
O enredo é, portanto, uma construção artística. Se no nível da diegese, a pergunta que orienta a leitura é “e depois?“; no nível do enredo, a pergunta é: por que as coisas são narradas desse jeito? e é essa a pergunta que devemos fazer na leitura de textos narrativos artísticos.
Por fim, esclareço que distinção apresentada entre diegese (ou fábula) e enredo tem caráter meramente metodológico; pois, na leitura do texto, não separamos uma do outro. Lembre-se de que tomamos contato com a diegese pela maneira como ela é contada, isto, por meio do enredo.
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Olá, Professor!
Gosto muito das suas postagens. Elas são maravilhosas e muito úteis. Muito obrigada!
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Oi Tania, obrigado por acompanhar as publicações do blogue. Qualquer sugestão, pode entrar em contato.
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Eu recebo os artigos por e-mail e sempre compartilho com minhas e meus colegas de trabalho. É um material de leitura que me ajuda na elaboração de minhas aulas. Agradeço o empenho e a disposição em manter o blog.
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Rosilene, muito obrigado por acompanhar as publicações do blogue e compartilhá-las com seus (suas) colegas de trabalho. Um abraço.