Clareza, coesão, coerência

Tempo de leitura: 8 minutos

Neste post, comento em rápidas pinceladas três qualidades que devem estar presentes em todos os textos para que atinjam seus propósitos comunicativos:  clareza, coesão e coerência.  

CLAREZA

Clareza é uma qualidade dos textos em geral, por isso deve ser sempre buscada. Ser claro é se fazer entender. Quem escreve quer ser lido, então deve-se facilitar a vida do leitor apresentando um texto que seja compreensível. Quando alguém não está compreendendo o que lê, abandona a leitura rapidamente. Alguns procedimentos ajudam a obter clareza, procure observá-los na redação de seus textos.

Evite períodos longos. Uma frase de grande extensão pode obrigar o leitor a lê-la mais de uma vez para compreender o sentido. É comum também o leitor, estando no meio da frase, ter de voltar ao início dela para recuperar alguma informação que já esqueceu, por isso prefira frases curtas, pois são mais fáceis de serem compreendidas. Não tenha receio de usar o ponto.

Prefira a ordem direta à inversa. Em português, os termos da frase costumam se apresentar na seguinte ordem: sujeito → verbo → complementos. Essa é a chamada ordem direta, a ordem natural dos termos da frase. Quando ela é invertida, colocando-se, por exemplo, o complemento no início e o sujeito no final, você obriga o leitor a fazer um esforço desnecessário para entender a mensagem, porque ele vai tentar mentalmente colocar em ordem direta aquilo que você escreveu em ordem inversa. Então, facilidade a vida dele.

Evite ambiguidades. Ambiguidade é duplicidade de sentidos. Se uma frase é ambígua, o leitor certamente ficará em dúvida sobre o que você quis dizer e pode até dar uma interpretação diferente daquela que você pretendia, prejudicando a clareza do texto. Observe esta manchete veiculada pelo site UOL:

Famílias de jovens mortos na Providência relatam ameaças a ministro

O leitor pode ficar em dúvida.  São as famílias dos jovens mortos que recebem ameaças ou é o ministro que está sendo ameaçado?

A ambiguidade, muitas vezes, ocorre porque uma palavra ou expressão pode se referir a mais de um termo da frase.

Veja este outro exemplo: É fácil comprar arma roubada no Brasil. Há duas leituras possíveis, porque o termo no Brasil pode estar se referindo a comprar ou a roubada. Para desambiguizar a frase, seria necessário mudar a redação conforme sugestão que apresento a seguir.

No Brasil, é fácil comprar arma roubada.

É fácil comprar arma que foi roubada no Brasil.

Sobre esse assunto você pode encontrar mais informações num post anterior do blogue que tem por título Ambiguidades, clicando no aqui.

Finalmente, para obter clareza tenha muita atenção com o vocabulário. Evite usar palavras desconhecidas ou que já caíram em desuso. Isso atenta contra a clareza além de revelar afetação de quem escreve.

COESÃO

Coesão diz respeito à relação entre elementos de texto que se interligam produzindo sentidos. A falta de coesão interfere na clareza do texto, na medida em que termos ficam soltos, não havendo amarração entre ideias. Coesão é mesmo que conexão. Para usar uma expressão da informática, ela estabelece links entre partes do texto. Na organização do texto, as palavras ganham sentido pelas relações de dependência que estabelecem entre si. Assim, a coesão é responsável pela continuidade do texto, à medida que liga suas partes facilitando sua compreensão pelo leitor.

Os mecanismos que conferem coesão ao texto são vários. Um deles consiste na amarração das ideias por meio de palavras que estabelecem relações lógicas entre segmentos de texto. Tais palavras recebem o nome de elementos de coesão e são representadas por conjunções, que se prestam a conferir relações de sentido de causa, condição, concessão, finalidade etc., preposições (a, após, até, para etc.), pronomes, usados para fazer referência a outros elementos do texto, e advérbios.

A coesão não é obtida apenas por meio de recursos gramaticais (conjunções, preposições, pronomes, advérbios). Ela decorre também da substituição de uma palavra por um sinônimo, hiperônimo ou hipônimo. Nesse caso, tem-se o que se denomina coesão lexical, como em Apresentou a petição ao juiz, mas o magistrado a indeferiu, a palavra magistrado retoma o termo juiz da qual é sinônimo.

Como a coesão se efetua por relações de sentido entre partes do texto, em diversos casos, ela se confunde com a coerência. Na verdade, a distinção entre coesão e coerência é, sobretudo, didática, pois nos textos as relações entre coesão e coerência são interdependentes. Segundo Irandé Antunes “a coesão é uma decorrência da própria continuidade exigida pelo texto, a qual, por sua vez, é exigência da unidade que dá coerência ao texto”

COERÊNCIA

Não é simples definir coerência. Na seção anterior, ressaltei que ela se confunde com a coesão. Para Othon M. Garcia (1978, p. 274), “a coerência consiste em ordenar e interligar as ideias de maneira clara e lógica…”. Como se pode notar, essa definição se confunde com a que apresentei de coesão. Veja ainda que, para esse autor, é impossível obter clareza sem coerência. Isso mostra que há uma relação muito estreita entre clareza, coesão e coerência, uma afetando a outra.

Para Koch e Elias (2009, p. 194), “a noção de coerência não se aplica, isoladamente, ao texto, nem ao autor, nem ao leitor, mas se estabelece na relação entre esses três elementos”. Isso significa que um texto pode ser considerado incoerente para um leitor ao passo que outro pode não ver nele incoerência alguma.

Em sentido amplo, coerência é ausência de contradição. Dessa forma, um texto será coerente quando não apresentar contradições internas que não sejam justificadas. Num texto argumentativo, por exemplo, a coerência decorre da ligação entre suas partes, introdução, desenvolvimento e conclusão. Se num texto argumentativo, na introdução apresenta-se uma tese afirmando ser contrário à obrigatoriedade do voto, no desenvolvimento (a argumentação propriamente dita) devem aparecer argumentos que comprovem essa tese e a conclusão deve decorrer logicamente dos argumentos apresentados. Isso é que se denomina coerência interna.

Por coerência externa, diz-se da não contradição do que se expõe no texto com o conhecimento tido por verdadeiro no contexto em que o se texto se inscreve. Nesse sentido, considera-se incoerente um texto que afirma que a Terra é plana ou que o câncer é uma doença incurável.

Uma forma bastante comum de incoerência são as generalizações apressadas, muito comum hoje nas redes sociais. Elas decorrem do fato de a exceção ser tomada como regra. Se alguém afirma: “É mentira que o fumo é prejudicial à saúde. Meu avô fumava muito desde jovem e morreu aos 96 anos”, temos uma generalização apressada, pois a afirmativa é mentira que o fumo é prejudicial à saúde é falaciosa pois decorre de uma exceção, de um caso particular (meu avô). O conhecimento científico de que se dispõe hoje em dia comprova que fumar é prejudicial à saúde. Afirmar o contrário é ser incoerente.

Esse tipo de falácia está presente nos discursos preconceituosos e intolerantes. Afirmações como Índio é preguiçoso, Português é burro, Brasileiro não gosta de trabalhar, Carioca é folgado, Brasileiro não sabe falar direito, não sabe gramática entre tantas outras, são fruto de generalizações apressadas.

A coerência deve estar presente em todos os tipos de texto. A melhor forma de obtê-la consiste em planejar o texto. De posso de um roteiro, sabe-se de onde se deve partir e aonde se pretende chegar e que caminhos percorrer. No entanto, quando se escreve, é comum afastar-se do roteiro; por isso, terminado o texto, ele deve ser obrigatoriamente revisto para detectar não só problemas de coerência, mas de clareza, de coesão e os de natureza gramatical (grafia, pontuação, concordância etc.).

Nos textos narrativos, embora não seja uma regra fixa, os acontecimentos devem ser expostos na ordem temporal em que ocorreram, isto é, do passado para o presente. As descrições são feitas do ponto de vista de quem observa. Se na narração, a preocupação se volta para temporalidade, na descrição ela recai na espacialidade, portanto deve-se atentar para a ordem em que o objeto é observado, por exemplo, se de cima para baixo, de dentro para fora, da direita para a esquerda, do perto para o longe etc.

Em textos argumentativos e expositivos, a coerência decorre da ordenação das ideias, o que pressupõe que argumentos e informações mantenham entre si relações lógicas de causa e efeito, de finalidade, de condição etc., estabelecidas por elementos gramaticais denominados conectivos (porque, já que, para que, se, caso etc.). Quanto aos textos argumentativos, é recomendável que o argumento mais forte seja apresentado por último.

6 Comentários


  1. Gostei muito. É bem claro e didático. Aprendi bastante, assim como nas suas gramaticas.

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